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Dose Certa percorre o caminho da tradição no CD 'Pra sempre samba'


Suposto “túmulo do samba”, segundo Vinicius de Moraes, São Paulo gerou grande parte dos grupos de pagode romântico, que encheram o famoso gênero musical de teclados e de clichês popularescos, ávidos pelo sucesso comercial. Distantes da produção de nomes como Adoniran Barbosa, Paulo Vanzolini e Demônios da Garoa – só para citar alguns cânones da música paulistana – os pagodeiros viveram seu auge durante a década de 1990 e hoje, por questões de sobrevivência, se aproximam do chamado sertanejo universitário, que domina as paradas atuais.
Possível “novo quilombo de Zumbi”, São Paulo também viu crescer uma geração resistente aos modismos, disposta a preservar a cadência do samba sem, contudo, ficar presa ao passado. Gente como Alemão do Cavaco (arranjos/ cavaquinho), Vitor da Candelária (percussão), Wilsinho Peruche (voz/ pandeiro), J. Petróleo (voz/ banjo) e Vinicius Almeida (contrabaixo/ violões), integrantes do grupo Dose Certa.
Com a adesão de Ana Costa (‘Ela e ele’), Pedro Miranda (‘Fogão de lenha’) e Leci Brandão (‘O tombo da corrente’), entre outros, o grupo gravou o CD ‘Pra sempre samba’, durante uma apresentação no Teatro Fecap, em São Paulo. Lançado pela gravadora Universal Music, o álbum reverencia grandes nomes do samba carioca já na primeira faixa, ‘Samba, eu te agradeço’, que leva a assinatura de Mauro Diniz, filho do portelense Monarco. Com a participação de Ivan Lins, o batuque carioca continua na faixa ‘No compasso do samba’, parceria dos bambas Sereno e Moacyr Luz – este um admirador/ frequentador das rodas de samba da terra da garoa. João Nogueira (1941 – 2000) é homenageado em ‘Velho João’ (Adilson Bispo/ Zé Roberto), e Wanderley Monteiro participa de ‘Perseguir a paz’, sua parceria com Luiz Carlos da Vila (1949 – 2008). Entre as inéditas destacam-se ‘Peito ferido’ (Wilson Sucena/ Alemão do Cavaco) e ‘A rosa e o beija-flor’ (Milbe/ Yvison Bezerra/ Gerson da Banda). Celebrando o samba tradicional, os rapazes do Dose Certa comprovam a perenidade do gênero, fazendo a famosa expressão cunhada por Vinicius  ter sentido para outros grupos paulistas, que cometem versões de sucessos internacionais em ritmo de pagode e acham que estão fazendo samba – de provocar estremecimento nos túmulos de verdadeiros sambistas.

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