‘Qual é o assunto que mais lhe interessa?’, perguntava
Elba Ramalho, no título do ousado álbum com o qual sacudiu a poeira da
acomodação, em 2007. Oito anos depois, a cantora parece ter encontrado novas
respostas para a questão em ‘Do meu olhar pra fora’, seu 33º disco,
recém-lançado pela gravadora Coqueiro Verde Records. Liberdade artística,
religiosidade, formas de amor e outras questões contemporâneas estão na mira de
Elba. Produzido por Luã Mattar e Yuri Queiroga, o novo disco apresenta uma
sonoridade moderna, embalando o repertório eclético, que passa pelo rock,
reggae e até mesmo fado, sob o viés nordestino, que pontua a carreira artística
da cantora. ‘Olhando o coração’ (Dominguinhos/ Climério) abre os
trabalhos da melhor maneira. Um das duas inéditas assinadas por Dominguinhos
(1941 – 2013), com quem Elba dividiu seu disco de 2005, a ritmada e sedutora
faixa injeta contemporaneidade no velho xote, que ganha roupa nova com as
programações do DJ Dolores, os pífanos de Dirceu Leite e o azeitado acordeom de
Rafael Meninão. Terceira incursão da cantora pela obra de Pedro Luís, de quem
já gravou ‘Os beijos’ e ‘Noite severina’, ‘Fazê o quê’ surge em ponto de
ebulição. A percussão vigorosa, guitarras rascantes, metais em brasa e a
contundente interpretação de Elba fazem da faixa uma das melhores do disco. Com
jeito de afoxé pop, ‘Só pra lembrar’ (Dani Black/ Zélia Duncan) soa meio
deslocada após os dois petardos iniciais. Origem dos versos que nomeiam o
álbum, ‘É o que interessa’ (Lenine/ Dudu Falcão) é um acerto. Melhor intérprete
do pernambucano Lenine, a paraibana coloca sua voz mais grave, seu canto
maduro, a serviço da bela canção existencialista. Música do primeiro disco do extinto grupo pernambucano
Cordel do Fogo Encantado, ‘Nossa Senhora da paz’ (Clayton Barros/ Emerson
Calado/ José Paes Lira/ Nego Henrique) repõe ‘Do meu olhar pra fora’ na atraente
pressão inicial, graças ao ótimo arranjo que harmoniza guitarras, percussão e a
luminosa harpa de Cristina Braga. O emocionante acordeom de Toninho Ferragutti
embala ‘Contrato de separação’ (Dominguinhos/ Anastácia), sentida canção
lançada por Nana Caymmi em 1979, abrandando mais uma vez a audição. Talvez esta
alternância de intensidades rítmicas tão distintas atrapalhe a fruição do disco.
Quem sabe, outra sequência das faixas fosse mais adequada. A terceira canção assinada por Dominguinhos (e Fausto
Nilo), é o inédito e surpreendente fado, ‘Nos ares de Lisboa – Um passarinho
enganador’, bonita faixa, que une as vozes de Elba e da cantora portuguesa
Carminho. Destacam-se, também o bandolim de Armandinho e a viola portuguesa de
Diogo Clemente. Escolhido para divulgar o álbum, o reggae ‘Árvore’ (Edson
Gomes) faz o ouvinte balançar, assim como a deliciosa ‘Patchuli’, que traz nos
vocais seu autor, Chico César. Embora seja lembrado como compositor gravado com
frequência por Maria Bethânia, Chico encontra em Elba Ramalho, a cantora ideal
para suas músicas mais sacolejantes. O clima novamente arrefece em ‘La noyée’
(Serge Gainsbourg), discutível incursão de Elba no cancioneiro francês. Bem
melhor é sua visita à obra de Chico Sciente (1966 – 1997). ‘Risoflora’, faixa
do primeiro álbum da banda pernambucana Nação Zumbi, ressurge radiante, sem
perder a pegada característica no movimento Mangue Beat. Com seu onírico
arranjo, ‘Ser livre’ se distancia do samba esperado de uma parceria de Arlindo
Cruz e Zeca Pagodinho, e encerra do ‘Do meu olhar pra fora’ – álbum em que Elba
Ramalho exercita um assunto que sempre nos interessa: sua música.
“Quando eu não puder pisar mais na Avenida/ Quando as minhas pernas não puderem aguentar/ Levar meu corpo junto com meu samba/ O meu anel de bamba/ Entrego a quem mereça usar”. Ao lançar seu primeiro disco, ‘A voz do samba’, em 1975, Alcione viu os versos melancólicos de ‘Não deixe o samba morrer’ (Edson Conceição/ Aloísio Silva) ganharem o país, tornando-se o primeiro sucesso da jovem cantora. Radicada no Rio de Janeiro desde 1967, a maranhense cantava em casas noturnas que marcaram época nas noites cariocas. Nestas apresentações, seu abrangente repertório incluía diferentes gêneros da música brasileira, além de canções francesas, italianas e norte-americanas também presentes no rádio. Enquanto isso, o samba conquistava novos espaços na década de 1970. Em 1974, Clara Nunes viu sua carreira firmar-se nacionalmente com o disco ‘Alvorecer’, do sucesso de ‘Conto de areia’ (Romildo Bastos/ Toninho Nascimento). No mesmo ano, Beth Carvalho obteve seu primeiro êxito como sambista com ...
Comentários