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Novo CD de Jeneci, 'De graça', conserva as altas doses de doçura


Três anos após estrear no mercado fonográfico com o superestimado ‘Feito para acabar’, Marcelo Jeneci lança seu segundo álbum, ‘De graça’ (Slap/Natura Musical). O semblante mais sério, com olhos delineados e uma indefectível barba ostentada pelo artista paulista sugerem algum amadurecimento, causado pelo fim de um relacionamento amoroso, segundo o próprio Jeneci afirmou em recentes entrevistas. Como outros colegas da cena musical contemporânea, Marcelo quer mostrar sua dor elegante. Nada que afugente os fãs, afinal as altas doses de doçura que caracterizaram ‘Feito para acabar’ foram conservadas. Os vocais açucarados de Laura Lavieri nos duetos à la Leno & Lilian, ou nos solos como ‘Tudo bem, tanto faz’ (Marcelo Jeneci/ Laura Lavieri/Arnaldo Antunes), contribuem para a atmosfera juvenil, sem tanta instabilidade climática. Lágrimas e chuvas molham o vidro da janela, mas o ‘Temporal’ (Marcelo Jeneci/Isabel Lenza) anunciado logo se dissipa: “olha em paz que a nuvem já se desfaz”, anuncia Jeneci em tom messiânico.
Bem produzido por Kassin e Adriano Cintra, com grandiloquentes arranjos de cordas assinados por Eumir Deodato em muitas faixas, ‘De graça’ é pretensiosamente intenso em momentos como ‘Pra gente se desprender’ (Marcelo Jeneci/Isabel Lenza), ‘Um de nós’ (Marcelo Jeneci), ‘9 luas’ (Marcelo Jeneci/ Raphael Costa) ou ainda em ‘A vida é bélica’ (Marcelo Jeneci/Isabel Lenza). Contudo, os momentos de fofura explícita amenizam qualquer sofrimento.
A faixa-título ecoa ‘Parabéns’, gravada por Caetano Veloso em seu ‘Abraçaço’. Não por acaso, ‘Julieta’ (Marcelo Jeneci/Isabel Lenza) parece ser prima direta da ‘Anna Julia’, antimusa dos Los Hermanos. O ótimo arranjo de cordas feito pelo maestro norte-americano Jherek Bischoff contribui para a beleza de ‘Alento’ (Marcelo Jeneci/Isabel Lenza). Fartas porções de Jovem Guarda, de música popular romântica dos anos 1970, além de pitadas de Tropicalismo estão presentes em ‘Nada a ver’ (Marcelo Jeneci), em ‘O melhor da vida’ (Marcelo Jeneci/ Luiz Tatit) e ‘Sorriso madeira’ (Marcelo Jeneci).
‘Só eu sou eu’ (Marcelo Jeneci e Arthur Nestrovisk) sentencia o cantor e compositor, cuja música reflete a crescente turma que brinca de ser adulto, mas não abre mão da fofura adolescente. Se você faz parte desses corações enternecidos aproveite a nova safra de Marcelo Jeneci. É de graça.

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