Pular para o conteúdo principal

'Samba dobrado' traz obra de Djavan no canto singular de Rosa Passos


Há tempos Rosa Passos visita a obra de Djavan. Em seu segundo disco, ‘Curare’ (1991), se encontra o registro de ‘Sim ou não’. Dois anos depois a baiana gravou ‘De flor em flor’. Em 1999 foi a vez de ‘Beiral’ ganhar a interpretação cool de Rosa, que em 2002 lançou ‘Azul’, álbum dedicado às composições de Gilberto Gil, João Bosco e... Djavan. Além da faixa-título, entraram no disco ‘Samurai’, ‘Aliás’, ‘Açaí’ e ‘A ilha’. ‘Álibi’ também ganhou sua versão em ‘Romance’, de 2008. Naturalmente todo esse histórico também contribui para a sensação de familiaridade sentida logo à primeira audição de ‘Samba dobrado – As canções de Djavan’, novo CD de Rosa Passos. Distribuído pela gravadora Universal Music, ‘Samba dobrado’ finalmente concretiza o longo namoro musical, com direto a afagos do compositor em texto no encarte, prontamente retribuídos pela cantora na autoral ‘Doce menestrel’, parceria com Fernando de Oliveira, que encerra do disco.
Obra que ganha forte acento jazzístico, especialmente nos sambas, sinuosos, de quebradas inesperadas, as canções de Djavan se ajustam facilmente ao canto elegantemente minimalista de Rosa, desde sempre associado à bossa de certo João. Assim, a cantora põe sua singular musicalidade a serviço de sucessos como ‘Pedro Brasil’, ‘Capim’, ‘Fato consumado’ e ‘Serrado’, além da faixa-título. Acompanhada por músicos como Fábio Torres (piano), Celso de Almeida (bateria), Marcus Teixeira (violão), Paulo Paulelli (baixo), Ivan Sacerdote (clarinetes), Jorge Helder (baixo acústico), Vinicius Dorin (sax tenor), Daniel D’Alcântara (trompete) e Hélio Alves (piano), Rosa deita e rola ao recriar as menos conhecidas ‘Maçã do rosto’, ‘Lei’ e, sobretudo a irresistível ‘Para-raio’, um dos grandes momentos do álbum.
Delicada, ela recria ‘Pétala’ acompanhada pelo seu solitário violão, em momento que rivaliza com a pungente ‘Faltando um pedaço’, cujo belo arranjo de flautas e clarinetes merece destaque. ‘Linha do Equador’ (Djavan/ Caetano Veloso) traça o céu de Brasília com inédita suavidade. Estilo que não caiu muito bem em ‘Cigano’, canção que já mereceu cores mais quentes na sedutora interpretação de Zélia Duncan. Detalhe que não ofusca o brilho do ótimo álbum que ratifica a influência do alagoano Djavan no canto da baiana Rosa.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Joias musicais de Gilberto Gil são reeditadas

               A Universal Music reabre seu baú de preciosidades. Desta vez, a dona do maior acervo musical do país, traz duas joias do cantor, compositor e violonista Gilberto Passos Gil Moreira, recentemente eleito imortal pela Academia Brasileira de Letras. De 1971, o disco londrino, ‘Gilberto Gil’, reaparece em nova edição em vinil, enquanto ‘Refestança’, registro do histórico encontro de Gil e Rita Lee, de 1977, finalmente ganha versão digital.             Gravado durante o exílio do artista baiano em Londres, o quarto LP de estúdio de Gilberto Gil foi produzido por Ralph Mace para o selo Famous e editado no Brasil pela Philips, atual Universal Music. O produtor inglês também trabalhava com Caetano Veloso, que havia lançado seu primeiro disco de exílio no mesmo ano. Contrastando com a melancolia expressada por Caetano, Gil fez um álbum mais equilibrado, dosando as saudades do Brasil...

50 anos de Claridade

Clara Nunes (1942 – 1983) viu sua carreira deslanchar na década de 1970, quando trocou os boleros e um romantismo acentuado pela cadência bonita do samba, uma mudança idealizada pelo radialista e produtor musical Adelzon Alves. Depois do sucesso do LP ‘Alvorecer’, de 1974, impulsionado pelas faixas ‘Menino deus’ (Mauro Duarte/ Paulo César Pinheiro), ‘Alvorecer’ (Délcio Carvalho/ Ivone Lara) e ‘Conto de areia’ (Romildo/ Toninho Nascimento), a cantora mineira reafirmou sua consagração popular com o álbum ‘Claridade’. Lançado em 1975, este disco vendeu 600 mil cópias, um feito excepcional para um disco de samba, para uma cantora e, sobretudo, para um disco de samba de uma cantora. Traço marcante na trajetória artística e na vida de Clara Nunes, o sincretismo religioso está presente nas faixas ‘O mar serenou’ (Candeia) e ‘A deusa dos orixás’, do pernambucano Romildo e do paraense Toninho Nascimento, os mesmos autores de ‘Conto de areia’. Eles frequentavam o célebre programa no qual Adelzon...

Galeria do Amor 50 anos – Timóteo fora do armário (ou quase)

            Agnaldo Timóteo lançou o disco ‘Galeria do amor’ em 1975. Em pleno regime militar, o ídolo popular, conhecido por sua voz grandiloquente e seu temperamento explosivo, ousou ao compor e cantar a balada sobre “um lugar de emoções diferentes/ Onde a gente que é gente/ Se entende/ Onde pode se amar livremente”. A canção, que se tornaria um sucesso nacional, foi inspirada na famosa Galeria Alaska, antigo ponto de encontro dos homossexuais na Zona Sul carioca – o que passaria despercebido por boa parte de seu público conservador. O mineiro de Caratinga já havia suscitado a temática gay no disco ‘Obrigado, querida’, de 1967. A romântica ‘Meu grito’, feita por Roberto Carlos para a sua futura mulher, Nice, ganhou outras conotações na voz poderosa de Timóteo. “Ai que vontade de gritar seu nome, bem alto no infinito (...), só falo bem baixinho e não conto pra ninguém/ pra ninguém saber seu nome, eu grito só ‘meu bem'”, canta Agnaldo, que nunca assu...