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Ellen Oléria dispensa sutilezas em CD pós 'The voice'


Ganhadora da primeira edição do programa ‘The voice’, da Rede Globo, Ellen Oléria lança pela gravadora Universal Music seu terceiro CD, como parte da premiação conquistada no grito. Com um timbre bacana, acertando vez por outra nas interpretações, Oléria faz parte da crescente turma de admiradores do estilo vocal exagerado de muitas cantoras norte-americanas. Tal predileção fica evidente logo na primeira faixa, ‘Anunciação’ (Alceu Valença, 1983), que começa muito bem, mas termina alguns tons acima. A prática é recorrente ao longo do disco, como se Ellen quisesse provar sua potência vocal.
O ecletismo adotado pelo programa televisivo – e pela quase totalidade de cantoras novatas surgidas a cada semana – reverbera em boa parte do repertório, concebido para agradar aos mais variados gostos. Assim, Ellen alinha ‘Aqui é o país do futebol’ (Milton Nascimento/ Fernando Brant, 1970), tema de viés político renovado pelas manifestações deflagradas país a partir de junho deste ano, e o sucesso popularesco ‘Nuvem passageira’ (Hermes de Aquino), faixa em que aparece mais contida.
Há obviedade na escolha de ‘Maria, Maria’ (Milton Nascimento/ Fernando Brant, 1976), música exaustivamente cantada por aspirantes à fama. Jorge Ben Jor tem sua ‘Taj Mahal’ (1972) escalada para animar a festa em versão nada sutil, mesmo mal de que padece ‘Zumbi’ (1974), outra joia de Ben Jor, lapidada com lirismo por Caetano Veloso no CD ‘Noites do norte’ (2000).
O excesso vocal da cantora brasiliense se reflete na obra da compositora de ‘Geminiana’ (Ellen Oléria/ Felipe Viegas/ Poliana Martins), ‘Linhas de nazca’ (Ellen Oléria) e ‘Testando’ (Ellen Oléria), faixas de sotaque soul, um tanto datado.  Oléria se sai melhor nas delicadas ‘Não lugar’ (Ellen Oléria) e ‘Córrego’ (Ellen Oléria). Sim, ela baixa o tom quando quer. Com escolhas menos preguiçosas e direção firme, Ellen Oléria pode fugir do destino de outras ganhadoras de programas de competições musicais, tão efêmeros quanto o sucesso momentâneo que provocam.

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