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Ana Carolina tenta parecer leve em #AC


Lançado em junho de 2013, o sexto CD de inéditas de Ana Carolina tenta aproximar a obra passional da artista mineira das pistas de dança – algo já ensaiado em trabalhos anteriores, embora em menores doses. Produzido a quatro mãos por Ana e por Alê Siqueira, #AC (Armazém/ Sony Music) conserva a intensidade peculiar que provoca reações igualmente arrebatadas de críticos e fãs. A pretensa aura moderna está na sonoridade obtida pela ausência da bateria, substituída pela trinca de programações (a cargo de Mikael Multi, Dj Cia, Alê Siqueira e da própria Ana), percussão e scratches.
Em time que está ganhando não se mexe (muito), como bem sabe a artista, que viu o álbum ‘Nove’ (2009) ser mal recebido por seu público, justamente por (tentar) se afastar das canções de apelo populista. Deste modo o amor passional, tema preferido de Ana, se traveste de baladinha pop em ‘Combustível’ (Ana Carolina/ Edu Krieger), em alta rotação nas rádios do seguimento adulto. Ele reaparece mais (in)tenso em ‘Luz acesa’ (Ana Carolina/ Antônio Villeroy) e ‘Leveza da valsa’ (Ana Carolina/ Guinga), ambas alocadas como faixas-bônus, tentativa de fazer o álbum parecer menos romântico, ma non troppo. Sintomaticamente, o tango ‘Mais forte’ (Ana Carolina/ Chiara Civello/ Tony Bungaro), com sua letra no melhor estilo ‘volta por cima’ (“Sonhei, sorri, caí, depois eu me levantei”), leva vantagem na escolha da próxima faixa de trabalho.
Bamba em 2001, no CD ‘Ana Rita Joana Iracema e Carolina’, a musa inspiradora se faz agora de ‘Esperta’ (Ana Carolina/ Chiara Civello/ Edu Krieger) e encara a ‘Pole dance’ (Ana Carolina/ Edu Krieger) embalada pelas programações eletrônicas. Incluída apenas no álbum físico, a ritmada ‘Libido’ (Ana Carolina/ Edu Krieger) elenca os filósofos Platão, Maquiavel e Descartes, recorre ao “azul da atmosfera e o vermelho de Marte” e traz sussurros à la Madonna em ‘Erótica’ (1992) para manter o clima pretensamente sensual, presente nas já citadas ‘Pole dance’ e ‘Esperta’.
Se as questões românticas não apresentam muitas novidades, é preciso estar atento às inovações tecnológicas, como indicam a experimental ‘Um sueño bajo el agua’ (Ana Carolina/ Chiara Civello), com suas citações ao Google e à Apple, e ‘Pelo iPhone’ (Ana Carolina/ Antônio Villeroy), que menciona o samba original de Donga e Mauro de Almeida, de 1917, no título. Outro samba, ‘A Rita’, serviu de inspiração para ‘A resposta da Rita’ (Ana Carolina/ Edu Krieger), faixa em que a discretíssima participação de Chico Buarque, autor do clássico de 1966, avaliza a versão.
“Eu faço listas enquanto eu bebo”, diz a cantora e compositora em ‘Bang bang 2’ (Ana Carolina/ Rodrigo Pitta), o que talvez explique a sucessão de ícones na letra de ‘Canção pra ti’ (Ana Carolina/ Moreno Veloso/ Carlos Rennó). Ana Carolina quer dançar, se derreter, mas precisa ganhar alguma leveza nos movimentos em sua pista de dança idealizada. Música dançante costuma ser mais divertida.

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