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'Sou eu', primeiro CD da cantora Lu Oliveira, deixa boa impressão


‘Sou eu’, álbum de estreia da cantora fluminense Lu Oliveira, traz apenas dez faixas. Pode parecer pouco, principalmente para uma novata que “precisa” dizer a que veio, mas a opção se mostra acertada logo na primeira audição. A moça, de voz agradável e segura, soa sincera nas faixas arranjadas pelos experientes Arthur Verocai, Leandro Braga, Jacques Morelenbaum, João Carlos Coutinho e Cristovão Bastos, recrutados pelo produtor Zé Renato.
A começar pela linda faixa-título assinada pelo maestro Moacir Santos (1926 – 2006) e pelo compositor Nei Lopes, é clara a escolha de um repertório que gira em torno do samba, sem que Lu chegue realmente a pisar no terreiro. Essa sensação fica mais evidente em ‘Baticum de samba’ (Roque Ferreira/ Paulo César Pinheiro, 2004), que carece da “cadência de tambor/ malícia de tantã”, enfim, da batucada reverenciada nos versos de Pinheiro. Paulo César também assina a letra de ‘Dia de graça’, samba que comunga a igualdade entre as etnias, lançado pelo parceiro Dori Caymmi em 2009.
As boas regravações da pouco conhecida ‘Amor nas estrelas’ (João Donato/ Lysias Enio, 2009) e de ‘Tenha pena de mim (Ai, ai, meu Deus)’ (Babaú/ Cyro de Sousa, 1938), samba lançado por Aracy de Almeida (1914 – 1988), confirmam o cuidado na escolha do repertório. ‘Paixão pelos ares’ (Zé Renato/ Pedro Luís) é o destaque entre as inéditas, que incluem ainda ‘Mulata’ (Maurício Coutinho/ Rui Aragão) e ‘Passou, passou’ (Moacyr Luz/ Rogério Batalha).
Se o samba de Djavan, ‘Delírio dos mortais’ (2007), soa pálido, a joia ‘Na ilha de Lia, no barco de Rosa (Meio-dia, meia-lua)’, composta por Edu Lobo e Chico Buarque para a trilha sonora do balé ‘A dança da meia-lua’ (1988), é o ponto alto de ‘Sou eu’. A cantora debutante parece encontrar ali um caminho a ser seguido – quem sabe o canto de Lu Oliveira floresça distante do baticum do samba.

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