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'Coitdadinha bem feito' exalta a contemporaneidade da obra de Ro Ro



Movido pelo desejo de “montar um panorama de vozes masculinas dos mais variados estilos e escolas”, o jornalista Marcus Preto aceitou o convite do DJ Zé Pedro para ser o diretor artístico de um novo projeto da Joia Moderna. Depois de reunir cantoras de várias gerações nos tributos aos compositores Taiguara (1945 – 1996) e Guilherme Arantes, a gravadora pilotada pelo DJ lança ‘Coitadinha bem feito’, CD (disponível para download: http://www.coitadinhabemfeito.com.br/homeque traz dezessete cantores interpretando composições de Ângela Ro Ro, pinçadas de seus quatro primeiros discos, lançados a partir de 1979. 
Longe da reverência submissa, comum em homenagens semelhantes, o resultado reflete a cena musical paulistana, berço da maioria dos intérpretes, com sua sonoridade retrô-futurista, que já influencia artistas de outras localidades. Sinceras, as interpretações (em sua maioria) delicadas suavizam a veemência dos versos da sagaz compositora carioca. No país das cantoras, talvez falte aos novos (e outros nem tanto) intérpretes certa dose de testosterona. Contudo, ‘Coitadinha bem feito’ tem belos momentos como os dos pernambucanos Lirinha, em ‘Renúncia’ (Ângela Ro Ro, 1980), e Otto, na faixa título ‘Coitadinha, bem feito!’ (Sergio Bandeira/ Ângela Ro Ro, 1981). Os paulistanos Thiago Pethit, Gui Amabis e Dani Black também se saem bem em ‘Mares da Espanha’ (Ângela Ro Ro, 1979), ‘Abre o coração’ (Ângela Ro Ro, 1979) e ‘Tola foi você’ (Ângela Ro Ro, 1979), respectivamente.
Arregimentados por Marcus, os cantores (e os produtores) cumprem a oportuna tarefa de exaltar a contemporaneidade da obra desta artista tão importante para a música popular brasileira. Num país onde quase ninguém se move artisticamente sem contar com o dinheiro público via lei de incentivo e grassam a preguiça e a ganância, refletidas em requentados projetos caça-níqueis e/ ou popularescos, merece destaque o profissionalismo do DJ Zé Pedro, que aposta na inteligência e no amor à música – dos artistas e, principalmente, do público. 

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