Pular para o conteúdo principal

Centenário Pedro Caetano ganha bela homenagem


Para comemorar o centenário do pai, o compositor Pedro Caetano (1911 – 1992), Cristina Caetano imaginou um projeto que incluía blog, site, documentário, show, DVD, enfim, tudo aquilo que um grande artista – e sua obra – merece em uma data tão expressiva. Ela foi atrás do sonhado patrocínio, mas, surpreendentemente, não obteve a resposta esperada. O relato em primeira pessoa faz parte do vídeo que antecedeu o show ‘Pedro Caetano 100 anos’, apresentado por Cristina Buarque, Mariana Baltar e Marcos Sacramento nas noites de 25 e 26 de agosto de 2011, no Teatro Rival Petrobrás. Para a alegria do público que lotou o tradicional reduto cultural da Cinelândia – e dela própria – Cristina encontrou outros entusiastas da música popular brasileira, dispostos a não deixar passar em branco a efeméride.
Cronista musical, Pedro Caetano retratou através de sambas, choros, valsas e marchinhas carnavalescas inspiradas, cenas cotidianas do Rio de Janeiro, capital da República – como atesta o privilegiado roteiro do espetáculo. Aos cantores citados juntaram-se Luiz Flavio Alcofra (violão), Pedro Aragão (bandolim), Josimar Carneiro (violão de 7 cordas), Jayme Vignoli (cavaquinho), Lena Verani (clarineta), Netinho Albuquerque e Magno Julio (percussão). Parceiro tardio de Pedro Caetano, Chico Adnet também participou da apresentação, que teve momentos memoráveis.
Conhecida por sua ligação com o samba mais tradicional e, principalmente, por sua relação com a Velha Guarda da Portela, Cristina Buarque foi a primeira a se apresentar. Com pouca extensão vocal, a cantora desfiou quatro parcerias de Pedro e Claudionor Cruz: ‘Disse-me-disse’, ‘Retratinho dele’, a valsa ‘Duas vidas’ e a divertida ‘Salve o Américo’. A conhecida ‘O que se leva dessa vida’ (Pedro Caetano) foi a deixa para Mariana Baltar entrar em cena.
À vontade, a moça ganhou o público com suas interpretações sempre afinadas, ótimas dicção e presença cênica. Sua delicada releitura de ‘Nova ilusão’ (Pedro Caetano/ Claudionor Cruz) rivaliza com a gravação feita por Zélia Duncan no excelente show ‘Eu me transformo em outras’ (2005). Mudando o clima sem perder a leveza, Mariana se faz brejeira em ‘Engomadinho’ (Pedro Caetano/ Claudionor Cruz), gravada originalmente por Aracy de Almeida (1914 – 1988) na década de 1940. ‘O samba agora vai’ (Pedro Caetano) e o choro ‘A felicidade perdeu seu endereço’ (Pedro Caetano/ Claudionor Cruz) completam o set da formosa cantora que passou a bola para Marcos Sacramento durante a execução da buliçosa ‘Botões de laranjeira’ (Pedro Caetano).
Comentar o excepcional senso rítmico do cantor (que também assina a direção) e sua qualidade vocal é “chover no molhado”. Marcos faz misérias com os versos que falam da “Maria Madalena dos Anzóis Pereira”. O mesmo acontece durante a engraçada ‘O bom cabrito e a má cabra’ (Senna/ Pedro Caetano). No número seguinte, mostrando que faz parte da nobre linhagem de intérpretes masculinos neste país de cantoras, Marcos recria ‘Caprichos do destino’ (Claudionor Cruz/ Pedro Caetano), tristíssima valsa lançada por Orlando Silva em 1937. Os sincopados ‘Foi uma pedra que rolou’ (Pedro Caetano) e ‘Sandália de prata’ (Pedro Caetano/ Alcyr Pires Vermelho) também merecem destaque.
Três sucessos carnavalescos encerram o show, com a participação de todos os cantores: o samba ‘Onde estão os tamborins’ (Pedro Caetano), a marchinha ‘Eu brinco’ (Com pandeiro ou sem pandeiro) (Claudionor Cruz/ Pedro Caetano), lançada no Carnaval de 1944, em pleno racionamento causado pela Segunda Grande Guerra, e ‘É com esse que eu vou’ (Pedro Caetano), não por acaso, nome do recente e festejado musical que resgata os sambas carnavalescos. Parodiando o compositor, com dinheiro ou sem dinheiro, o centenário de Pedro Caetano foi muito bem festejado em duas noites cariocas.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A voz do samba - O primeiro disco de Alcione

  “Quando eu não puder pisar mais na Avenida/ Quando as minhas pernas não puderem aguentar/ Levar meu corpo junto com meu samba/ O meu anel de bamba/ Entrego a quem mereça usar”. Ao lançar seu primeiro disco, ‘A voz do samba’, em 1975, Alcione viu os versos melancólicos de ‘Não deixe o samba morrer’ (Edson Conceição/ Aloísio Silva) ganharem o país, tornando-se o primeiro sucesso da jovem cantora. Radicada no Rio de Janeiro desde 1967, a maranhense cantava em casas noturnas que marcaram época nas noites cariocas. Nestas apresentações, seu abrangente repertório incluía diferentes gêneros da música brasileira, além de canções francesas, italianas e norte-americanas também presentes no rádio. Enquanto isso, o samba conquistava novos espaços na década de 1970. Em 1974, Clara Nunes viu sua carreira firmar-se nacionalmente com o disco ‘Alvorecer’, do sucesso de ‘Conto de areia’ (Romildo Bastos/ Toninho Nascimento). No mesmo ano, Beth Carvalho obteve seu primeiro êxito como sambista com ‘1...

Joias musicais de Gilberto Gil são reeditadas

               A Universal Music reabre seu baú de preciosidades. Desta vez, a dona do maior acervo musical do país, traz duas joias do cantor, compositor e violonista Gilberto Passos Gil Moreira, recentemente eleito imortal pela Academia Brasileira de Letras. De 1971, o disco londrino, ‘Gilberto Gil’, reaparece em nova edição em vinil, enquanto ‘Refestança’, registro do histórico encontro de Gil e Rita Lee, de 1977, finalmente ganha versão digital.             Gravado durante o exílio do artista baiano em Londres, o quarto LP de estúdio de Gilberto Gil foi produzido por Ralph Mace para o selo Famous e editado no Brasil pela Philips, atual Universal Music. O produtor inglês também trabalhava com Caetano Veloso, que havia lançado seu primeiro disco de exílio no mesmo ano. Contrastando com a melancolia expressada por Caetano, Gil fez um álbum mais equilibrado, dosando as saudades do Brasil...

Galeria do Amor 50 anos – Timóteo fora do armário (ou quase)

  Agnaldo Timóteo lançou o disco ‘Galeria do amor’ em 1975. Em pleno regime militar, o ídolo popular, conhecido por sua voz grandiloquente e seu temperamento explosivo, ousou ao compor e cantar a balada sobre “um lugar de emoções diferentes/ Onde a gente que é gente/ Se entende/ Onde pode se amar livremente”. A canção, que se tornaria um sucesso nacional, foi inspirada na famosa Galeria Alaska, antigo ponto de encontro dos homossexuais na Zona Sul carioca – o que passaria despercebido por boa parte de seu público conservador. O mineiro de Caratinga já havia suscitado a temática gay no disco ‘Obrigado, querida’, de 1967. A romântica ‘Meu grito’, feita por Roberto Carlos para a sua futura mulher, Nice, ganhou outras conotações na voz poderosa de Timóteo. “Ai que vontade de gritar seu nome, bem alto no infinito (...), só falo bem baixinho e não conto pra ninguém/ pra ninguém saber seu nome, eu grito só ‘meu bem'”, canta Agnaldo, que nunca assumiria sua suposta homossexualidade. ...