Pular para o conteúdo principal

'Pássaros urbanos' expõe o canto maduro de Fagner

Raimundo Fagner lançou seu primeiro LP em 1973. ‘Manera, fru-fru, manera’, disco que trazia ‘Canteiros’ (Cecília Meireles/ Fagner) e ‘Mucuripe’ (Belchior/ Fagner), futuros sucessos do jovem cantor e compositor cearense. Gravada por Elis Regina (1945 – 1982) um ano antes e por Roberto Carlos dois anos depois, ‘Mucuripe’ apontava o surgimento de uma nova e promissora leva de artistas nordestinos na cena musical brasileira. Quatro décadas mais tarde, Fagner registra ‘Paralelas’, um dos clássicos do antigo parceiro, em seu 37º disco, ‘Pássaros urbanos’. A tocante faixa assinala o tom romântico da maioria das canções do álbum produzido por Michael Sullivan para a gravadora Sony Music. Coautor de ‘Deslizes’, marco da fase mais popular da carreira de Fagner, Sullivan posiciona ‘Pássaros urbanos’ em algum lugar entre as décadas de 1980 e 1990 – fase áurea da dupla formada com Paulo Massadas – e a sonoridade contemporânea. Não por acaso, ele assina com Anayle Lima a faixa mais fraca do CD, ‘Tanto faz’, que ecoa aquelas composições que dominaram as rádios na época.
O canto maduro e menos arrebatado de Fagner se mostra mais interessante nas composições dos antigos parceiros Clodo Ferreira e Fausto Nilo, como as belas ‘Se o amor vier’ (Fagner/ Clodo Ferreira) e ‘Versos ardentes’ (Fausto Nilo/ Fagner), além da faixa-título (Fausto Nilo/ Cristiano Pinho). Com Zeca Baleiro, Fagner acerta novamente em ‘Toda luz’ e ‘Samba nordestino’, esta com a participação do artista maranhense, com quem dividiu ótimo disco lançado em 2003. Entre o samba exaltação de sua terra, ‘No Ceará é assim’ (Carlos Barroso, 1942) e a beleza sertaneja de ‘Doce viola’ (Jaime Além) – gravada por Maria Bethânia no CD ‘Encanteria’ (2009) –, Fagner encerra o bom álbum retratando a solidão da ‘selva de pedra’ na ‘Balada fingida’ (Fausto Nilo/ Fagner): “A cidade não termina/ na dobra da esquina/ que nos viu chorar”. Por causa da perversa velocidade do tempo, ‘Pássaros urbanos’ pode não bisar o sucesso de antes, mas certamente tocará corações e mentes de uma legião de fãs de Raimundo Fagner.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A voz do samba - O primeiro disco de Alcione

  “Quando eu não puder pisar mais na Avenida/ Quando as minhas pernas não puderem aguentar/ Levar meu corpo junto com meu samba/ O meu anel de bamba/ Entrego a quem mereça usar”. Ao lançar seu primeiro disco, ‘A voz do samba’, em 1975, Alcione viu os versos melancólicos de ‘Não deixe o samba morrer’ (Edson Conceição/ Aloísio Silva) ganharem o país, tornando-se o primeiro sucesso da jovem cantora. Radicada no Rio de Janeiro desde 1967, a maranhense cantava em casas noturnas que marcaram época nas noites cariocas. Nestas apresentações, seu abrangente repertório incluía diferentes gêneros da música brasileira, além de canções francesas, italianas e norte-americanas também presentes no rádio. Enquanto isso, o samba conquistava novos espaços na década de 1970. Em 1974, Clara Nunes viu sua carreira firmar-se nacionalmente com o disco ‘Alvorecer’, do sucesso de ‘Conto de areia’ (Romildo Bastos/ Toninho Nascimento). No mesmo ano, Beth Carvalho obteve seu primeiro êxito como sambista com ...

Joias musicais de Gilberto Gil são reeditadas

               A Universal Music reabre seu baú de preciosidades. Desta vez, a dona do maior acervo musical do país, traz duas joias do cantor, compositor e violonista Gilberto Passos Gil Moreira, recentemente eleito imortal pela Academia Brasileira de Letras. De 1971, o disco londrino, ‘Gilberto Gil’, reaparece em nova edição em vinil, enquanto ‘Refestança’, registro do histórico encontro de Gil e Rita Lee, de 1977, finalmente ganha versão digital.             Gravado durante o exílio do artista baiano em Londres, o quarto LP de estúdio de Gilberto Gil foi produzido por Ralph Mace para o selo Famous e editado no Brasil pela Philips, atual Universal Music. O produtor inglês também trabalhava com Caetano Veloso, que havia lançado seu primeiro disco de exílio no mesmo ano. Contrastando com a melancolia expressada por Caetano, Gil fez um álbum mais equilibrado, dosando as saudades do Brasil...

50 anos de Claridade

Clara Nunes (1942 – 1983) viu sua carreira deslanchar na década de 1970, quando trocou os boleros e um romantismo acentuado pela cadência bonita do samba, uma mudança idealizada pelo radialista e produtor musical Adelzon Alves. Depois do sucesso do LP ‘Alvorecer’, de 1974, impulsionado pelas faixas ‘Menino deus’ (Mauro Duarte/ Paulo César Pinheiro), ‘Alvorecer’ (Délcio Carvalho/ Ivone Lara) e ‘Conto de areia’ (Romildo/ Toninho Nascimento), a cantora mineira reafirmou sua consagração popular com o álbum ‘Claridade’. Lançado em 1975, este disco vendeu 600 mil cópias, um feito excepcional para um disco de samba, para uma cantora e, sobretudo, para um disco de samba de uma cantora. Traço marcante na trajetória artística e na vida de Clara Nunes, o sincretismo religioso está presente nas faixas ‘O mar serenou’ (Candeia) e ‘A deusa dos orixás’, do pernambucano Romildo e do paraense Toninho Nascimento, os mesmos autores de ‘Conto de areia’. Eles frequentavam o célebre programa no qual Adelzon...