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Em tom maior, Martinho da Vila desfia clássicos em show enxuto



Martinho da Vila subiu ao palco do Vivo Rio na noite de sábado, 28 de julho de 2012, para lançar o CD ‘4.5 atual’, no qual regravou o repertório do seu primeiro disco, de 1969, para comemorar 45 anos de carreira. “Este é um show que só acontece com a participação de vocês”, avisou. Seguindo a estrutura do espetáculo anterior ‘Lambendo a cria’ (2011), o sambista de Duas Barras (RJ) também surge sozinho para cantar ‘Menina moça’, partido-alto que o notabilizou nacionalmente em 1967, e ‘Casa de bamba’, com a adesão do receptivo público que lotou a casa noturna do Aterro do Flamengo.  Com a participação do violonista Gabriel de Aquino, Martinho reviveu a intimista ‘Amor, pra que nasceu?’ e ‘Brasil mulato’, um dos muitos sambas de temática social de sua prodigiosa lavra.
Ao descerrar as cortinas, além dos músicos da melhor qualidade, o publico estava representado no palco por convidados do cantor e da banda. O clima familiar foi ressaltado pelas presenças de Maíra Freitas, Juliana Ferreira e Tunico da Vila (na percussão), filhos de Martinho. Os belos versos de ‘Tom maior’ emocionaram. O roteiro do show, composto de sucessos, e a tal interatividade com os espectadores, poderiam render uma enfadonha noite de karaokê, caso Martinho se limitasse a “reger” a multidão de cantores. Felizmente o sambista dosou com inteligência a participação do público e, em nenhum momento, deixou de ser a estrela do show.
A sucessão de hits impressiona: ‘O pequeno burguês’, ‘Quem é do mar não enjoa’, ‘Grande amor’ e ‘Boa noite’, aparecem lado a lado de outros momentos históricos da história do anfitrião que mudou os rumos do samba de enredo – e do desfile das escolas de samba – a partir de ‘Carnaval das ilusões’. O quarto lugar obtido pela Unidos de Vila Isabel no desfile na Candelária rendeu ‘Ciranda, cirandinha’, na qual Martinho critica a comissão julgadora: “Caramba, caramba/ Nem o Chico entendeu/ O enredo do meu samba”. ‘Quatro séculos de modas e costumes’ e ‘Iaiá do cais dourado’ (Rodolfo/ Martinho da Vila) ajudaram a consolidar o novo modo de fazer sambas de enredo, curtos e coloquiais.
Faixas bônus do CD ‘4.5 atual’, as mais recentes ‘Pãozinho de açúcar’ e ‘Samba dos passarinhos’ (Martinho da Vila/ Moacyr Luz) também foram inseridas no show, ressaltando a determinação de Martinho em não fazer concessões no enxuto roteiro. ‘Parei na sua/ Nhém nhém nhém’ (Cabana/ Martinho da Vila) são a senha para o partideiro da Vila relembrar mais um clássico, ‘Pra que dinheiro’, e apresentar o novo ‘Partido-alto de roda’, em que cita bambas cariocas e baianos, numa clara referência às origens do gênero musical. Martinho encerra a noite bisando ‘Casa de bamba’, deixando a sensação de que o show poderia – e merecia – continuar. Ponto para Zé Ferreira, que 45 anos depois de levar sua inspiração para a terra de Noel, mantém o samba em tom maior.

Comentários

Élida disse…
Poxa, pena eu não ter ido. Realmente deve ter sido maravilhoso. Estamos mesmo precisando de bons shows...Lendo seu texto sempre me transporto. Obrigado pela viagem.

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