Pular para o conteúdo principal

Dori Caymmi: alguém cantando por nós

O filho mais velho do mestre baiano Dorival Caymmi (1914 – 2008) comemora sete décadas de vida. Carioca nascido no bairro do Andaraí, Dorival Tostes Caymmi, dono de um estilo inconfundível, tornou-se uma das mais importantes referências da música brasileira feita a partir dos anos 1960, a chamada MPB. Para celebrar a efeméride, Dori presenteia seu público com 13 canções feitas a quatro mãos com seu principal parceiro, o poeta Paulo César Pinheiro. Todas inéditas, nada de manjadas regravações adornadas pela sonoridade da moda. Apenas o violão, seu cúmplice musical há 55 anos, acompanha Dori no álbum ’70 anos’, lançado pela gravadora Acari Records.
Canções praieiras, tão caras ao patriarca dos Caymmi, surgem sedutoras em faixas como ‘Manto real’, ‘Pesca na rede’ e ‘Espuma’. Embaladas pela voz grave do cantor, ‘Beira-rio, beira-estrada, beira-mar’ e ‘Toada do carro-de-boi’ compõem a paisagem interiorana de um país sonhado, que não se realizou plenamente. O verde das matas e mares, o azul celeste e o amarelo do sol tropical são matizes do Brasil idealizado e distante, que insiste em existir em canções como ‘Tela viva’ e ‘Dentro d´água’. Tudo é bonito de doer, como bem diz a cantora e compositora Joyce Moreno no texto de apresentação do disco.
Ainda que não fosse necessário, ’70 anos’ ratifica a qualidade da obra deste artista incomum em faixas como ‘Dia e noite’, ‘À toa’ e ‘O passo da dança’ – esta feita sob medida para uma interpretação incandescente de Gal Costa. Aliás, como seria bom se as composições de Dori fossem redescobertas. Não esqueço a emocionante gravação de ‘De onde vens’ (Dori Caymmi/ Nelson Motta) feita por Alcione em seu CD ‘Nos bares da vida’ (2000). O ‘Mestre’ ainda nos brinda com ‘Alguma voz’, outra pérola, cujos versos sintetizam o sentimento que aflora na audição de ’70 anos’: “Quando eu ouço alguma voz/ Na janela do horizonte/ De alguém cantando por nós/ É Deus cantando defronte”. Viva Dori Caymmi!

Comentários

Unknown disse…
Vou comprar agora no Itunes. vou sair à procura do disco físico. Linda capa! quero ler as letras, tocar no disco" "beira-mar, beira estrada, beira-rio..." sempre com Dori Caymmi-
Adorei Julio!
Unknown disse…
Corri para buscar o disco setenta anos- de Dori Caymmi, no Itunes, não encontrei...A resenha é bem bonita, Julio.
FELÍCIO TORRES disse…
Amigo Julio, coincidentemente, nesse momento, falava desse disco com uma amiga e, logo a seguir, vi seu post. Estou ansioso por ouvir essa pérola, ainda não o vi nas lojas. Dori é eternamente meu ídolo!
Outro disco dele que ouço muito e gosto demais chama-se "Mundo de dentro". A primeira faixa "Quebra mar", com a participação do Renato Braz já fala pelo disco. Fabuloso!

Grande abraço pra você.
Amigos, o CD pode ser comprado no site da Acari Records:
http://www.acari.com.br/setenta-anos-dori-caymmi.html
Unknown disse…
O cd está esgotado na gravadora... Alguém sabe onde encontrar?

Postagens mais visitadas deste blog

A voz do samba - O primeiro disco de Alcione

  “Quando eu não puder pisar mais na Avenida/ Quando as minhas pernas não puderem aguentar/ Levar meu corpo junto com meu samba/ O meu anel de bamba/ Entrego a quem mereça usar”. Ao lançar seu primeiro disco, ‘A voz do samba’, em 1975, Alcione viu os versos melancólicos de ‘Não deixe o samba morrer’ (Edson Conceição/ Aloísio Silva) ganharem o país, tornando-se o primeiro sucesso da jovem cantora. Radicada no Rio de Janeiro desde 1967, a maranhense cantava em casas noturnas que marcaram época nas noites cariocas. Nestas apresentações, seu abrangente repertório incluía diferentes gêneros da música brasileira, além de canções francesas, italianas e norte-americanas também presentes no rádio. Enquanto isso, o samba conquistava novos espaços na década de 1970. Em 1974, Clara Nunes viu sua carreira firmar-se nacionalmente com o disco ‘Alvorecer’, do sucesso de ‘Conto de areia’ (Romildo Bastos/ Toninho Nascimento). No mesmo ano, Beth Carvalho obteve seu primeiro êxito como sambista com ‘1...

Galeria do Amor 50 anos – Timóteo fora do armário (ou quase)

  Agnaldo Timóteo lançou o disco ‘Galeria do amor’ em 1975. Em pleno regime militar, o ídolo popular, conhecido por sua voz grandiloquente e seu temperamento explosivo, ousou ao compor e cantar a balada sobre “um lugar de emoções diferentes/ Onde a gente que é gente/ Se entende/ Onde pode se amar livremente”. A canção, que se tornaria um sucesso nacional, foi inspirada na famosa Galeria Alaska, antigo ponto de encontro dos homossexuais na Zona Sul carioca – o que passaria despercebido por boa parte de seu público conservador. O mineiro de Caratinga já havia suscitado a temática gay no disco ‘Obrigado, querida’, de 1967. A romântica ‘Meu grito’, feita por Roberto Carlos para a sua futura mulher, Nice, ganhou outras conotações na voz poderosa de Timóteo. “Ai que vontade de gritar seu nome, bem alto no infinito (...), só falo bem baixinho e não conto pra ninguém/ pra ninguém saber seu nome, eu grito só ‘meu bem'”, canta Agnaldo, que nunca assumiria sua suposta homossexualidade. ...

Joias musicais de Gilberto Gil são reeditadas

               A Universal Music reabre seu baú de preciosidades. Desta vez, a dona do maior acervo musical do país, traz duas joias do cantor, compositor e violonista Gilberto Passos Gil Moreira, recentemente eleito imortal pela Academia Brasileira de Letras. De 1971, o disco londrino, ‘Gilberto Gil’, reaparece em nova edição em vinil, enquanto ‘Refestança’, registro do histórico encontro de Gil e Rita Lee, de 1977, finalmente ganha versão digital.             Gravado durante o exílio do artista baiano em Londres, o quarto LP de estúdio de Gilberto Gil foi produzido por Ralph Mace para o selo Famous e editado no Brasil pela Philips, atual Universal Music. O produtor inglês também trabalhava com Caetano Veloso, que havia lançado seu primeiro disco de exílio no mesmo ano. Contrastando com a melancolia expressada por Caetano, Gil fez um álbum mais equilibrado, dosando as saudades do Brasil...