Pular para o conteúdo principal

Rita Ribeiro: Uma voz que precisa ser (mais) ouvida


Na noite de sexta-feira, 11 de fevereiro, Rita Ribeiro subiu ao palco do Vivo Rio para comemorar os sete anos de Tecnomacumba, vitorioso projeto que mistura sons afro-brasileiros e música eletrônica. Acompanhada por Israel Dantas (direção musical e guitarra), Lucio Vieira (programação eletrônica e bateria), Alexandre Katatau (contrabaixo e vocais), Pedro Milman (tecladista) e Paulo He-Man (percussão), a cantora maranhense fez a gira girar mais uma vez.
Os arranjos, azeitados, conseguem dar novo colorido a números chaves como ‘Jurema’ (domínio público/ adaptação Rita Ribeiro), ‘Moça bonita’ (Jair Amorim/ Evaldo Gouveia) e ‘Iansã’ (Caetano Veloso/ Gilberto Gil). A perfomance de Rita na canção dos baianos é tão impactante que provoca uma verdadeira comoção na legião de seguidores que lotou a casa de shows. Um público heterogêneo, com a cara da diversidade sociocultural do século XXI, que fez do local uma festa, com direito a coreografias e momentos que beiram o transe coletivo.Tudo comandado por Rita com segurança impressionante. Nada lhe foge à vista, nada lhe tira a concentração. Nem mesmo as participações afetivas, porém pouco ensaiadas, de Zeca Baleiro e Chico César.
Os principais compositores da discografia de Rita tiveram comportamentos díspares no show: Zeca estava pouco à vontade em ‘Domingo 23’ (Jorge Ben Jor) e Chico dominou melhor o palco em ‘Cavaleiro de Aruanda’ (Tony Osanah), apesar de não ter encontrado o tom certo. O que prejudicou a execução de ‘Oração ao Tempo’, um dos momentos mais bonitos de Tecnomacumba, quando Rita dá à música de Caetano Veloso um sentindo ainda mais sagrado. Os três ainda recriaram ‘Mamãe Oxum’, ponto de domínio público gravado por Zeca Baleiro em seu ótimo disco de estreia, ‘Por onde andará Stephen Fry’ (1997), com guitarras estridentes em contraponto à mansidão da divindade das águas doces.
A presença de Chico César propiciou uma boa novidade. A inclusão da remexida ‘Catimbó’, típica composição do paraibano, que Rita defendeu com competência e desenvoltura, incluindo um ponto de preto velho, com direito a performance, deixando a música ainda melhor.
Coisas de uma grande cantora que não pode se tornar “refém” de um público que adora aquele repertório e se diferencia dos admiradores iniciais conquistados através de seus inspirados discos de carreira. Os fãs de Tecnomacumba querem “tirar os pés do chão”. É evidente que a festa só se realiza porque Rita Ribeiro é uma excelente cantora. Contudo, não seria tempo de ouvi-la de outro modo? Em 2008 ela apresentou o belo show ‘(Sub)Urbano Coração’ com tons intimistas e canções românticas, mostrando um novo caminho a seguir. Tecnomacumba é um marco em sua carreira e na música popular brasileira, mas o canto de Rita Ribeiro é maior do que ele.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A voz do samba - O primeiro disco de Alcione

  “Quando eu não puder pisar mais na Avenida/ Quando as minhas pernas não puderem aguentar/ Levar meu corpo junto com meu samba/ O meu anel de bamba/ Entrego a quem mereça usar”. Ao lançar seu primeiro disco, ‘A voz do samba’, em 1975, Alcione viu os versos melancólicos de ‘Não deixe o samba morrer’ (Edson Conceição/ Aloísio Silva) ganharem o país, tornando-se o primeiro sucesso da jovem cantora. Radicada no Rio de Janeiro desde 1967, a maranhense cantava em casas noturnas que marcaram época nas noites cariocas. Nestas apresentações, seu abrangente repertório incluía diferentes gêneros da música brasileira, além de canções francesas, italianas e norte-americanas também presentes no rádio. Enquanto isso, o samba conquistava novos espaços na década de 1970. Em 1974, Clara Nunes viu sua carreira firmar-se nacionalmente com o disco ‘Alvorecer’, do sucesso de ‘Conto de areia’ (Romildo Bastos/ Toninho Nascimento). No mesmo ano, Beth Carvalho obteve seu primeiro êxito como sambista com ‘1...

Galeria do Amor 50 anos – Timóteo fora do armário (ou quase)

  Agnaldo Timóteo lançou o disco ‘Galeria do amor’ em 1975. Em pleno regime militar, o ídolo popular, conhecido por sua voz grandiloquente e seu temperamento explosivo, ousou ao compor e cantar a balada sobre “um lugar de emoções diferentes/ Onde a gente que é gente/ Se entende/ Onde pode se amar livremente”. A canção, que se tornaria um sucesso nacional, foi inspirada na famosa Galeria Alaska, antigo ponto de encontro dos homossexuais na Zona Sul carioca – o que passaria despercebido por boa parte de seu público conservador. O mineiro de Caratinga já havia suscitado a temática gay no disco ‘Obrigado, querida’, de 1967. A romântica ‘Meu grito’, feita por Roberto Carlos para a sua futura mulher, Nice, ganhou outras conotações na voz poderosa de Timóteo. “Ai que vontade de gritar seu nome, bem alto no infinito (...), só falo bem baixinho e não conto pra ninguém/ pra ninguém saber seu nome, eu grito só ‘meu bem'”, canta Agnaldo, que nunca assumiria sua suposta homossexualidade. ...

'Se dependesse de mim', um disco com a inconfundível marca de Wilson Simonal

               Lançado em 1972, ‘Se dependesse de mim’ marcou a estreia de Wilson Simonal na gravadora Philips. Ídolo inconteste nos anos 1960, Simonal buscava renovação. Para isso, os produtores Nelson Motta e Roberto Menescal optaram por um repertório essencialmente contemporâneo.             A faixa-título (Ivan Lins/Ronaldo Monteiro de Souza) traz versos simbólicos para o momento vivido por Simonal, como “Quero brisas e nunca vendavais”. O samba ‘Noves fora’ (Belchior/Fagner), gravado por Elis Regina, mas deixado de fora de seu LP de 1972, ganhou versão cheia de suingue de Simonal. ‘Expresso 2222’ (Gilberto Gil) circulava na voz de seu compositor e teve seu segundo registro, cujo arranjo passeia por diferentes ritmos. A melodiosa ‘Irmãos de sol’ (Marcos/Paulo Sérgio Valle) intui futuros dias mais bonitos. Em ‘Maria’ (Francis Hime/Vinicius de Moraes), Simonal revive a canção que defendeu ...